quinta-feira, 12 de novembro de 2009

 

Um dia no interior paulista

 

Era só uma mini saia cor de rosa

(a mim me pareceu vermelha)

A moça saiu de casa gloriosa

De ontem havia ainda uma centelha

Do olhar do rapaz da outra carteira

Fez o caminho mais longo orgulhosa

Que estava de sua silhueta

Hoje não era dia de ir pela beira

O centro hoje era das pernas e de sua saia.

(Ah, como o olhar dos outros é cruel)

A mini saia levou uma vaia

A moça permaneceu calada

Sua fantasia de Helena esfarrapada

(E era só uma mini saia cor de rosa.)

Terça-feira

Caiu a noite. Eu,com medo do escuro.
Caminhei nas pontas dos pés até a varanda
Toquei com as mãos o parapeito.
Meu peito tremia, eu tenho medo.
Abri os olhos num só golpe
para ver melhor.
Mas o mundo havia se apagado.

quinta-feira, 29 de outubro de 2009

Feliz Aniversário

 

Aquele meu amor

de minha adolescência

o mar me carregou.

Domingo feito tarde

Jogo por começar

Onda veio e carregou

O primeiro de meus carinhos

O menino de meus afetos

A água salgada me tirou

Foi se assim sem barquinho

de papel ou de madeira

O seu corpo foi sozinho

Virando espuma do mar

Os afetos de meu menino

Partiu quem primeiro me fez amar

Eu prá trás fiquei areia

Juventude foi aos poucos

Muito devagar

Vendo o rapaz que levava

para o fundo bem fundo do mar

A meninice de meu olhar.

sábado, 17 de outubro de 2009


H.O.

Morreu. Não foi em março, não foi em 80.

Morreu ontem, num incêndio. O fogo o levou daqui.

O sujeito não era mais, era trabalho.

Panos, cores ganhando o espaço. Fogo.

Herói. Foi-se sem ninguém fazer nada.

Preso no quarto do irmão, foi embora. Fogo.

Ninguém foi em seu socorro. Nenhuma voz.

Sobreviva ainda. Marginal.

Resista ainda. Volte ainda.

Aparecerá, eu sei, numa madrugada quando um passista do morro se levantar com seu

estandarte e rodar e rodar e rodar e rodar e rodar.

Nesse momento eu o verei ainda.

 

 

quarta-feira, 14 de outubro de 2009

Hoje acordei com vontade de ser correta.

Arrumar emprego, a cozinha e carro pra levar os filhos.

Escola pras crianças, leite para o gato e tirar as pulgas do cão.

Cedo. Bem cedo acordei e fui caminhar, agora vou me exercitar.

Poupar pra depois de envelhecer. Supermercado todo mês, 

empregada pra me aborrecer. 

A partir de hoje estarei muito ocupada, 

cerveja só as sextas depois das sete e antes das dez. 

Quando muito até as onze. 

Hoje acordei cedo pensando em ter salário, 

pensei em comprar uma gravata e um novo celular. 

Me preocupar com banco e a conta de luz, ler o jornal toda manhã.

Hoje acordei cedo, bem cedo e sem nenhuma vontade de viver.

segunda-feira, 14 de setembro de 2009


Carrego em meus ombros uma triste ferida

feita de agulhas partidas, Ainda sangra

o corte, Como uma lagarta permanece

Jamais tornada cicatriz (borboleta)

Sigo com minhas chagas, ferida

embora desejada, não me é querida

Imagino de prata uma adaga

que me amputasse os braços inteiros

Me cortaria desde os pulsos e arrancaria

de vez de mim esta tua ferida.

quinta-feira, 10 de setembro de 2009


No campo a flor sozinha se ergue ereta.

Caule frágil sustenta na cabeça o sol

cor amarela que seu olho não vê

mas o gesto existe na madrugada

e eu adormeço

o corpo em febre.

quarta-feira, 2 de setembro de 2009

Algo Secreto

Esses últimos meses me vi as voltas com o estudo da história. Confesso que não somos muito íntimas, talvez o fato de minha escolha pelas letras e pelas artes me afaste de uma perspectiva linear e desencadeada de narrativa. Mas enfim, como nem todo tempo se perde, eu me diverti e posso dizer até ter aprendido uma coisa ou outra. Foi uma idéia, aquelas de síntese que intentam provocar o leitor, que me agradou e me fez pensar fora da história. O texto era de Reinhart Koselleck, Crítica e Crise e a idéia a seguinte: o iluminismo surgiu do absolutismo, pois o monarca deixou aos súditos um espaço privado, particular para suas convicções e foi nesse lugar que a consciência pode se desenvolver. O iluminismo não me interessa em absoluto, mas essa idéia de um quarto dos fundos onde algo se constrói apesar de todos os vetores do resto da casa realmente me impressiona. Mais que isso, me atrai. Fico enxergando determinados atos cometidos que, à primeira vista, parecem vindos de lugar nenhum, mas agora sei. Eles foram criados no quarto dos fundos, no gabinete empoeirado. O quarto onde se guarda tudo aquilo que não se quer mais ver, mas que não podemos descartar. Ali certas decisões são tomadas, a revelia do resto da casa. É um segredo necessário.

Todos devem ter um segredo, qualquer um. Algo que não seja dado a ver, que não se mostre. Nisso sempre acreditei, quando mais nova alimentava os pombos da praça quando ninguém estava olhando, quando saía à tarde sem dizer aonde iria. Eu alimentava os pombos, aqueles mesmos aos quais eu maldizia na frente dos outros, os mesmo que recebiam meus chutes. À tarde, sozinha, eu os alimentava somente para ter um segredo. E para minha sorte e sobrevivência, pombos não tem memória. O segredo deve, de tempos em tempos, mudar, pois se gasta. Os pombos não fazem mais sentido, estão gastos. É preciso sempre outro, um novo segredo. O gabinete empoeirado deve crescer junto conosco, pois é daí que surgem os atos fundamentais. O ato inevitável vem dessa pequena saleta atrás de toda nossa consciência e nos impele a seguir e, portanto, agir apesar de nós mesmos.

I

sozinha.ataulfo de paiva, já andei por aqui. bandeiras rasgadas no meio fio. Don’t give up on me. diriam as bandeiras, ou era a mendiga preta que arrastava as malas.  mendiga preta virando adorno do leblon. vista turva, cerveja e fome. qual é o caminho de volta. acordar a mendiga. morder-lhe os tornozelos. nenhum chamado. Don’t give up on me. saudade de minha mãe. nem sei quem foi. vou me cobrir com as bandeiras despetaladas de vermelho e preto. aleijar a preta. manchar minha boca. chagas. mulher sem armas. dentes. ainda tenho dentes e bandeiras. fome e pés trocados. os tornozelos sujos da velha das malas. chora. eu. choro eu. grito na tua janela. Don’t give up on me. e depois durmo na esquina sem marquise da rue de rivoli.

 

terça-feira, 1 de setembro de 2009


Dia 9 de novembro.

 

Hoje sei que você vai morrer.

Inevitável.

O ato é inevitável.

Você diz que não agüenta mais, eu vejo.

Sei que acabou, o tempo, a madrugada mudou

e agora chega.

Não é mesmo?

Brindo sozinha à tua vida.

A tuas palavras, as que ficaram.

Vai, meu querido anjo torto.

Vai que a vida tem pressa

e a morte descansa.

Eu demorarei mais um pouco por aqui.

Qualquer hora (quem sabe?) eu te conheço.

 

               ***

escrevo num guardanapo.

por você.

porque escrevia em guardanapos

desejei um último brinde

por você

porque você partira antes de mim

adeus, amor, adeus, adeus

quinta-feira, 20 de agosto de 2009

Vai. Agora. Volta pra lá.

Retorna à tua velha casa.

Senta mais uma vez à tua mesa de madeira gasta

de frente a tuas paredes já mofadas.

Deita-te mais um pouco ao lado de tua velha mulher.

Corpo pálido e cansado.

Volta. Vai embora de mim.

Deita sobre seu corpo e tenta ainda, sobre a magreza branca,  algum afeto.

Te suplico. Volta. Vai e me deixa agora.

quarta-feira, 29 de julho de 2009


Numa noite de sexta-feira

                                                         pro Zé


Quando tudo já havia ocorrido

Todas as roupas guardadas

A mala pronta para nunca mais seguir ninguém

Quando a sensação era de terra estéril

A boca já havia secado

Acreditava nunca mais sentir fome e

era sereno meu olhar.

Sem esperar, sem querer

Caminhou ao meu lado

Disse. (Nem sei o que disse.)

A cor voltou às maçãs de meu rosto

e desisti de sentir calma.

quarta-feira, 24 de junho de 2009

V.

Corte reto e perfeito, risco diagonal na face esquerda.

Pequeno traço que lhe empresta a dureza de um passado

Marca de um corte, rastro de uma queda na infância

ou uma discussão mal sucedida depois de um jogo

um alguém que não gostou de ser abandonada

Ou apenas embriaguez e uma garrafa de vidro

Não conheço o passado do homem com a cicatriz no rosto

O que vejo é apenas o homem e seu rosto partido

O que desejo é apenas deixar a boca levemente aberta

junto àquela cicatriz, caso venha a sangrar novamente.

terça-feira, 23 de junho de 2009

O sujeito que não conheço

 

Andava arrastando os pés, apoiado por uma bengala alta

Talvez o equilíbrio precário viesse de uma velha falta

Quando menino pensava em ser meteorologista

A vida veio de banda e fez dele dentista

Não soube precisar seu desejo

Seguia esperando o lampejo

de luz fraca em alma vazia

Entre uma ideia e outra se aprazia

Arrancando distraidamente de moças os dentes

Sem nunca imaginar um dia poder ver-se contente

Sujeito que desejou examinar cúmulos nimbos e estratos

Passa os dias a prever das bocas futuras extrações dos tártaros

Acreditou que se olhasse para si mesmo bem no fundo

Poderia reagir e a qualquer hora ganhar o mundo

Permanecia no encardido do consultório

Sonhando em passar noites em algum frio observatório

Espera ainda em silêncio pela hora em que os desejos voltem

O instante um que seus gestos cresçam e se notem

Quem sabe da janela soprará um vento do sul

Que o descubra de seu trajes opacos e o deixe nu ou todo vestido de azul.

quinta-feira, 18 de junho de 2009

Educação

Vivíamos eu mais ela. Da casa , não guardo memória. Só o sol e o concreto da garagem. De certo, havia parede. Mais adiante me lembro da sala. Espere e veja. Leia. O pai não tinha. Havia existido no momento de existir. Depois fumaça e o nome João. João tem tantos. João tem de montão! Sopa de beterraba também era abundância. Fortalece o sangue. Crescia pensando pra que tanto sangue. A conversa era pouca. Rarefeita. Durava o tempo da mesa posta. Comia rápido. A palavra era escrita. Eu olhava. Era tanta letra.
Noite dessas ela falou. Bem podia ter alguém mais aqui. Só nós duas presta mais não. Muito feminino. Era bom um alguém homem. Só para estar. Sei lá. Precisava nem rosto. Madeira. Falou e se esqueceu. Ela era assim: falava a duração do tempo de estar por perto. Depois se entretinha. Ia embora.
Foi no outro dia. Outra página, sei não. Mirei o canto da sala e estava lá. O dito. Homem sem rosto. Não falava, nem olhava. Avisei a ela. Você falou. Ali. Agora existe. Tá por aqui por essas páginas. Deu os ombros.
O bicho, não sei se era. Madeira. O chão rangia ao seu andar. O bicho se arrastava. Me seguia às vezes. Lembrava de meu cão. O Biu. Incumbência.
- Você come, bicho? Dizia nada.
Dei para lixar ele. Esculpir. Fazer do dito, visto. Passou ao irreconhecível. Era coisa sem nome. O que não se nomeia vagando pelo mundo, sem canto. Sem estante. O algo iniciado por minha mãe. Ela deu. Largou a frase pelo meio. Nela um ganchinho de vazio. Preencheu. Preenchi.
Distraídos.


O casal vivia naquela pequena casa desarrumada. Viviam ali sem muito se preocupar, os objetos iam se aglomerando pelos cantos. Um dia achavam uma gravata que ele julgara perdida ou uma meia da qual ela nem se lembrava e riam contentes como tivessem ganho um presente novo. Os amigos que iam visitar estranhavam de começo, mas depois se acostumavam com a bagunça e até gostavam, era como um retorno a seus quartos de adolescentes. Passando-se os meses ela começou a incomodar-se. Foi depois de uma jantar na casa de outro jovem casal. Quero arrumar a nossa casa. Estantes para os livros e roupas dentro do armário. Passou algumas semanas nessa empreitada, tentava organizar os livros espalhados pela mesa e pelo chão, mas não podia. Que critério adotaria? Biografias em uma prateleira e ficção na outra. Mas a biografia não é também uma ficção? Pedia ajuda a ele, que concordava e ia alem: outra coisa, não é justo deixar Virginia Woolf na mesma altura de John Fante. Mas, eu botei Conrad no meio pra deixar ela protegida. Ah, não sei, ela devia estar com Clarice. Lá vem você com essa história de escrita feminina! Não é isso... Assim se distraiam e os livros continuavam espalhados, as camisas por cima dos livros, as gravatas escondidas e as meias esperando o próximo natal. Foi de um amigo próximo que veio a idéia de ter alguém em comum para cuidarem, um terceiro que os tornaria responsáveis, certamente não entenderam a que terceiro se referia o amigo e compraram um peixe. Aquário limpo, peixe dourado, comida apenas uma vez por dia, sabiam que peixes têm memória curta e se esquecem que já comeram. Divertiam-se com o débil olhar de sua nova aquisição, chegaram até e se apegar ao bicho. Mas nunca pensaram em repor a água do aquário e o pequeno foi tendo seu espaço reduzido, até chegar a um dedo de água. Quase nadando de lado, o pobre. A amiga comentou: acho que esse peixe aí não tá muito bem. Ela deu com os ombros, já se distraia com outra coisa, ele nem ouviu. Um dia ela se lembrou e perguntou, cadê o peixe? Ele tava meio estranho e botei um pouquinho no sol pra ver se animava. Na varanda o cadáver boiava em um pouco de água quase fervendo. Ih, acho que morreu. Quem? O peixe. É... morreu sim. Tem que jogar fora. Onde? Sei, lá. Privada. É. Qualquer hora eu jogo. E mais uma vez eram levados a outra direção e se esqueciam. Foi assim entre distrações e esquecimentos que ela foi embora. Ele nem percebeu. Num dia de muito silêncio na casa, ele foi até a varanda, talvez a procurasse, encontrou o peixe numa água podre e pensou: rapaz, isso ainda está aqui! Entornou o líquido na privada e foi ouvir aquele disco do Jorge Ben.

segunda-feira, 8 de junho de 2009

terça-feira, 19 de maio de 2009

Pela manhã na porta do elevador

 

Foi num pequeno momento

Desses onde nada acontece

Quando os segundos não fecham

Quando há um gap entre as horas

Foi assim.

Entre o sinal abrir e eu andar

Que fiz minha descoberta -

nós havíamos nos despedido.

quinta-feira, 7 de maio de 2009

II

Vejo o peixe parado na poça do aquário. Deve estar morto. Não tenho carinho por peixes, não sei. Vejo o bicho morto, mas não posso enterrá-lo. Decido deixar que a água se evapore e ele se acabe. Como se acaba um peixe? Parei de beber água. Solidariedade.

quarta-feira, 29 de abril de 2009

Uma sextina quebrada para um herói esquecido.

 

Avisto o homem que carrega a pedra.

O homem sobe passo a passo a montanha.

Ao chegar no cume, vê cair a rocha.

Objeto perdido que estava em seus ombros.

O homem, então, sabe que deve dar a volta.

Desce agora a montanha, nos olhos, sombra.

 

Desce, o sol à pino não lhe faz sombra

Desce de novo busca a perdida pedra.

Busca a pedra sem pensar em sua iminente volta.

O homem está ali há tanto, que é parte montanha

A caída pedra aguarda o regresso aos ombros

Assim a volta ao cume fará do homem, rocha.

 

Mãos quebradas como uma velha rocha

O homem que fugiu de se tornar sombra

Um  morto, carrega a vida nos ombros

Morto? Sabe-se vivo enquanto pedra.

Sabe-se homem, não todo montanha.

Condenado sempre ao caminho da volta.

 

Caminho andado nunca é apenas volta,

Assim como ele é homem e rocha.

Sabe não ser aquela a mesma montanha

Mesmo que à minha vista seja a mesma sombra

como a mesma é também outra pedra.

Outra nos mesmos cansados ombros

 

Em sua ciência que vem dos ombros

O homem sabe que jamais há volta

O Homem tira ensinamento da pedra

Pedra mesma e sempre outra rocha

como homem nunca deixa mesma sombra

subindo e descendo mesma e outra montanha

 

Avisto de longe o homem da montanha.

Seriam meus aqueles tristes ombros?

Minha a tosca e mal desenhada sombra?

Onde seria, então, minha saída de volta?

Eu que um dia sonhei ser  uma rocha,

Espero ainda encontrar minha própria pedra.

 

 

 

domingo, 26 de abril de 2009


Compromissos inadiáveis

 

No quarto, à luz acesa

me despi completamente

pra você.

No quarto, a luz acesa

testemunha todo

meu prazer.

No quarto há luz acesa

mesmo de manhã.

A noite toda me entreguei

a você.

Foi mesmo uma pena você , infelizmente,

não ter podido estar presente.

sexta-feira, 24 de abril de 2009


 

Um passante

 

A vista turva e os sons, gemidos.

A mão sinuosa passou, deixou

o corpo todo em alarido.

Os lençóis jogados em torno

rasgou a alça do vestido

dentemordendo, bocas abertas

língua no ouvido.

De ondas calmas e certas

o ritmo se fez frenético

respiração curta, gemido

(e pensar que tudo veio de um papo poético)

Que noite...e a luz após! -Efêmero encontro

cujo movimento me fez gozar outra vez.

De manhã já foi, banho não tomou, calça mal vestiu

Não deixou nem um talvez

Longe daqui vai, amante.

Passou.

terça-feira, 21 de abril de 2009


Inversão térmica.

Chuva na cidade do Rio de Janeiro.
Uma frente fria provoca chuvas na capital fluminense.
Faz 16 graus.
Uma massa de ar seco que predomina sobre a cidade de São Paulo
deixa o tempo aberto e a temperatura agradável na capital paulista.
Faz 28 graus.

quinta-feira, 16 de abril de 2009


Valsa

São três pra lá, três pra cá.

Três tigres bêbados

tropeçando pernas pelo porto.

Jules, Jim e ele

quem sabe nossa Jeanne Moreau.

terça-feira, 14 de abril de 2009



 Silêncio.


Um lance. Mais um lance.  

Só, move uma vez mais.                                                                                                              

Na diagonal. O que lhe resta.                                                                                                                         

Um gesto e a espera.                                                                                                                                

Tempo. O outro se move.              

No solo branco. Lages. 

                                                  Desliza na posição livre.                                         

Traz o gesto do fim.                                                                               

O último movimento.                                                                                                                        

Suspiro. O Rei morto                                                                                             

Não pôde abolir o acaso.                                                                                                           

Olhos ainda abertos.                                                                                                                      


                       

 

 


segunda-feira, 13 de abril de 2009


Resposta

 

Entregou o livro e disse:

Confie em mim

guarde no vazio

da estante de madeira

essa história de amantes.

Estanque.

A surpresa de páginas arrancadas

(confie em mim)

A luz do escritório acesa

e sobre sua mesa

as folhas rasgadas.

O tato da mão fez sentir o rasgo, ferida de papel.

Li as frases de tua estória despedaçada,

não teve graça.

Costurei com fios a memória arrancada.

Afiei as lâminas da casa.

Escrevi na pele com agulhas, cicatriz de carne.

Me feri com letras

Te odeio com facas

Espero gelada, tornada

punhal de prata

a tua volta da estrada

mais uma e agora a última vez.

Aguardo, lâmina afiada,

a tua voz afinada

que dirá pela última vez:

 - Confie em mim.



Naufrágio.

 

Estou aqui. Trancada.

Escrevo mensagens

em garrafas.

From: my dark night.

As portas e janelas

fechadas.

Gengivas sempre semi

cerradas.

Feridas na boca, sangue, coagulação.

Envio as letrinhas

encarceradas.

Can you help me out.

As garrafas acumuladas nos canos da descarga

   fazem entupir todos os líquidos que escorrem

    por baixo de minha porta e impedem

                                  minha liquidifica-

                                                                    ção.

Me arrisco com ideias engarrafadas

Que a mão não risca mais, confusão.

Se não posso lápis,

ao menos mata borrão.