quinta-feira, 18 de junho de 2009

Distraídos.


O casal vivia naquela pequena casa desarrumada. Viviam ali sem muito se preocupar, os objetos iam se aglomerando pelos cantos. Um dia achavam uma gravata que ele julgara perdida ou uma meia da qual ela nem se lembrava e riam contentes como tivessem ganho um presente novo. Os amigos que iam visitar estranhavam de começo, mas depois se acostumavam com a bagunça e até gostavam, era como um retorno a seus quartos de adolescentes. Passando-se os meses ela começou a incomodar-se. Foi depois de uma jantar na casa de outro jovem casal. Quero arrumar a nossa casa. Estantes para os livros e roupas dentro do armário. Passou algumas semanas nessa empreitada, tentava organizar os livros espalhados pela mesa e pelo chão, mas não podia. Que critério adotaria? Biografias em uma prateleira e ficção na outra. Mas a biografia não é também uma ficção? Pedia ajuda a ele, que concordava e ia alem: outra coisa, não é justo deixar Virginia Woolf na mesma altura de John Fante. Mas, eu botei Conrad no meio pra deixar ela protegida. Ah, não sei, ela devia estar com Clarice. Lá vem você com essa história de escrita feminina! Não é isso... Assim se distraiam e os livros continuavam espalhados, as camisas por cima dos livros, as gravatas escondidas e as meias esperando o próximo natal. Foi de um amigo próximo que veio a idéia de ter alguém em comum para cuidarem, um terceiro que os tornaria responsáveis, certamente não entenderam a que terceiro se referia o amigo e compraram um peixe. Aquário limpo, peixe dourado, comida apenas uma vez por dia, sabiam que peixes têm memória curta e se esquecem que já comeram. Divertiam-se com o débil olhar de sua nova aquisição, chegaram até e se apegar ao bicho. Mas nunca pensaram em repor a água do aquário e o pequeno foi tendo seu espaço reduzido, até chegar a um dedo de água. Quase nadando de lado, o pobre. A amiga comentou: acho que esse peixe aí não tá muito bem. Ela deu com os ombros, já se distraia com outra coisa, ele nem ouviu. Um dia ela se lembrou e perguntou, cadê o peixe? Ele tava meio estranho e botei um pouquinho no sol pra ver se animava. Na varanda o cadáver boiava em um pouco de água quase fervendo. Ih, acho que morreu. Quem? O peixe. É... morreu sim. Tem que jogar fora. Onde? Sei, lá. Privada. É. Qualquer hora eu jogo. E mais uma vez eram levados a outra direção e se esqueciam. Foi assim entre distrações e esquecimentos que ela foi embora. Ele nem percebeu. Num dia de muito silêncio na casa, ele foi até a varanda, talvez a procurasse, encontrou o peixe numa água podre e pensou: rapaz, isso ainda está aqui! Entornou o líquido na privada e foi ouvir aquele disco do Jorge Ben.

1 comentário:

  1. Un blog, que es como un filme, que es una pregunta al desconocido, que a veces puede ser un s.o.s., palabras que, presas en la red, esperan la curiosidad de un buzo despistado, un naufrago que quizás también perdió todo, la embarcación y los compañeros de viaje, todo menos las palabras, o la capacidad de leerlas, pues todo texto es un grito desde la soledad y toda memoria una frase sentimental, a veces inventada, a veces real… Escribo perdiéndome porque no entiendo este silencio.

    Que un ser humano publique, en un mismo día, dos textos mayores, poderosos, hijos de la literatura y de la vida, y que como respuesta no tenga respuesta, no “acuso de recibo”, no “comment”…

    Yo no deseaba entrar en este segundo texto y durante días me hice el “distraído”. Ocurre que como nadie dice nada, escribe nada, me veo en la obligación de hacer algo. Poca cosa. Dejar aquí, para que conste, que también este segundo texto me ha emocionado y divertido. Humor en la pérdida (y esto es algo nuevo y muy sano). Y decir que, es lo que pienso, siento dos textos frágilmente unidos. Hay la historia de la pareja y la historia del pez. En las dos alguien se va o se pierde o se muere (es lo mismo), y en ambas un sentimiento de levedad gracioso (uso aquí “gracia” en sus dos sentidos). Que las dos historias tienes mucho que ver, estoy de acuerdo; que tengan que sucederse no tanto. Y es que en la pareja existe ya un final no escrito pero adivinado: Él se va, o desaparece, porque hacía parte del desorden (y al ordenar Ella, Él ya no tenía razón de ser) o porque Él sólo era capaz de amar en el desorden (y la idea del Amor sólo en el desorden es muy bella). Y la historia del pez se me antoja como la de un hijo no deseado. Es una parábola terrible y al mismo tiempo inofensiva. Y creo que merece un texto a parte.

    Saludos.

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